28 de março de 2024

CRÔNICA – Três experiências de vida ou morte no sertão da Bahia (Francisco Nery Júnior)

Por

Redação (pa4.com.br)

 

A vida, o leitor já sabe, é composta de experiências. Delas tiravam proveito os povos que sabiam ouvir os seus anciãos. Valorizavam o conhecimento acumulado, buscavam beber o conhecimento amadurecido e – pasmem – os consultavam. Hoje, ocupam o seu lugar os gurus da Internet, geralmente jovens no vigor do rompante da juventude, alguns com milhões de “seguidores”. De passagem, apenas de passagem, do falecido Padre Léo a caminho da beatificação católica: “Cuidado com o guru que você segue!”

Nesse afã, as meninas dos noticiários televisivos esbanjam comentários. Analisam e opinam sobres os fatos noticiados para milhões de telespectadores. Esforçam-se, devidamente uniformizadas com as pontas da última moda, vocabulário “atual”, fácil e accessível, para atualizar os que as assistem. Os meninos, idem; mais do que elas, com o tempero do sotaque caipira sulista que troca o “r” pelo “s”. Assim, partido vira “pastido” e sorte vira “soste”. E sofre o português, a caminho da evolução para “postuguês”. E a pátria brasileira vai sendo “educada” pelos meninos e meninas dos nossos meios de comunicação.

Então, falávamos de experiências, de preferência aquelas dos macacos velhos que não metem a mão em cumbuca e não se queimam tão facilmente como os macacos novos. Servidas ao leitor, três experiências nos andares em caminhos nem sempre seguros do sertão da Bahia:

A primeira, a caminho ali do Caixão, já nas terras das Alagoas. De repente, poucos metros após uma curva, uma loura, daquelas que costumamos ver nos noticiários policiais da televisão, no meio do asfalto, braços para o ar pedia socorro. Um dos membros do grupo missionário, o mais velho e experiente, sargentão da Polícia Militar há muito tempo reformado, recomendou que não parássemos. Poderia ser um assalto. Paramos, porém, ao avistarmos um fusca de rodas para o ar uns poucos metros à direita da pista. Como não havia SAMU, e considerando o risco de início de incêndio, tratamos de retirar o companheiro da loura que nos parecia alcoolizado.

Nós o colocamos deitado no banco traseiro de um Corcel que, a essa altura, havia parado na pista de sentido contrário, com a recomendação de ele não se levantar. Nós sabíamos da importância da imobilidade como prevenção de danos à coluna. O nosso “paciente” insistia em se levantar e, sentado, foi levado ao Pronto Socorro do Nair Alves de Souza. Tempos mais tarde, o encontramos em uma cadeira de rodas imobilizado da cintura para baixo.

Desta vez, retornávamos de Malhada Grande. Particularmente, eu sempre me recomendava me inteirar das primeiras medidas a serem prestadas a uma parturiente. Eu me sabia no sertão da Bahia e poderia acontecer uma emergência. Fui adiando a busca desse conhecimento até que o inesperado aconteceu: na beira da estrada, uma jovem mãe dava à luz o seu bebê. Que fazer? Como cortar o cordão umbilical? Quais os cuidados de esterilização? A que altura cortar o cordão?

Para alívio dos membros do grupo – e para desencargo de consciência -, uma jovem carona já tinha trabalhado em um posto de saúde e declarou ser necessária a contagem de quatro dedos para o corte do cordão. Como a placenta continuava no ventre da mãe e a criança respirava satisfatoriamente, os dois foram levados para o HNAS e tudo acabou bem.

Agora a estrada era a de Santa Brígida. No carro, dois de nós e três missionários americanos. Quase na entrada da cidade, fomos parados por cerca de quinze homens fortemente armados, revólveres e fuzis apontados para nós.

Sem pânico e confiantes, discretamente saímos, mãos devidamente à mostra. A turma era enfezada e logo percebemos que não estavam para brincadeira. Não era inspeção de rotina!

Encerrando a história, uma semana antes, uns cabras estranhos, altos e vistosos, andaram sondando detalhes sobre a cidade e o pessoal da segurança desconfiou serem ladrões de banco. Nós seríamos os ladrões que agora estariam voltando para realizar o roubo.

Francisco Nery Júnior

 

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